Dado alarmante precisa motivar uma séria discussão sobre o papel da igreja na prevenção desses casos
Por Tiago Chagas
A violência doméstica é uma triste realidade no Brasil e uma pesquisa
descobriu uma informação ainda mais alarmante: 40% das mulheres que se
declaram vítimas de agressões físicas e verbais de seus maridos são
evangélicas.
A descoberta é resultado de uma pesquisa da Universidade
Presbiteriana Mackenzie a partir de relatos colhidos por organizações
não-governamentais (ONGs) que trabalham no apoio às vítimas desse tipo
de violência.
“Não esperávamos encontrar, no nosso campo de pesquisa, quase 40% das
atendidas declarando-se evangélicas”, diz um trecho do relatório
divulgado, de acordo com informações da Rede Super.
A surpresa não é maior do que a preocupação que existe sobre o
contexto das agressões: muitas das vítimas dizem sentirem-se coagidas
por seus líderes religiosos a não denunciarem seus maridos.
“A violência do agressor é combatida pelo ‘poder’ da oração. As
‘fraquezas’ de seus maridos são entendidas como ‘investidas do demônio’,
então a denúncia de seus companheiros agressores as leva a sentir culpa
por, no seu modo de entender, estarem traindo seu pastor, sua igreja e o
próprio Deus”, denuncia o documento.
Os responsáveis pelo estudo ressaltam, no relatório, que as
comunidades de fé onde essas mulheres que sofrem violência congregam
precisam agir de maneira diferente: “O que era um dever, o da denúncia,
para fazer uso de seu direito de não sofrer violência, passa a ser
entendido como uma fraqueza, ou falta de fé na provisão e promessa
divina de conversão-transformação de seu cônjuge”, constatam.
No programa De Tudo Um Pouco, da Rede Super, o pastor Renato Vieira
Matildes e o advogado Antônio Cintra Schmidt analisaram os dados dessa
pesquisa.
De acordo com Matildes, a omissão dos pastores é parte importante nos
casos de violência doméstica: “A gente percebe a omissão pela falta de
orientação e pela omissão mesmo de não querer informar. Porque é mais
fácil virar e dizer: ‘Olha, vá embora que nós vamos orar e Deus vai
fazer a obra’”, disse.
O pastor ponderou que a ação espiritual é válida, mas é necessário
tomar medidas que garantam a segurança dessas mulheres: “Deus realmente
continua fazendo a sua obra. Porém é mais difícil a gente instruir essas
pessoas. É difícil você sentar com um casal e sentar com eles uma
noite, um dia. Essas são questões difíceis de lidar e as pessoas não
querem fazer isso e caminham para o lado mais fácil […] Isso não pode
ser assim e não deve ser assim”, acrescentou.
Para o advogado Schmidt, a igreja pode ter condições de ajudar a mulher
que se encontra nesta situação de forma mais efetiva: “Seria muito
interessante se as igrejas tivessem esse acompanhamento e esse grupo
para ajudar na conscientização da mulher”, comentou. “A mulher tem um
receio tremendo por todos esses fatos, de fazer uma denúncia, de expor a
convivência familiar dela e em qualquer nível. Acontece que às vezes
não é ela quem expõe. O vizinho, por exemplo, vê uma agressão e pode
fazer a denúncia. E feita a denúncia, a Polícia vem e dali para frente
não tem mais como parar o processo”, explicou.
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